Vamos Conversar



Sim, precisamos aprender a conversar.

 Eu sei, eu sei, isso parece aquela típica frase clichê da literatura de autoajuda que tem se acumulado por todos os lados na nossa sociedade desde meados dos anos 80, mas o que você lerá a seguir não tem nada a ver com essa marola pseudo psicológica. Não irei tentar lhe convencer, caro leitor, da importância de você falar de seus sentimentos, o que sim é importante, nem da importância de sermos mais comunicativos, o que também é importante, mas a importância destes temas nada tem a ver com o que a auto ajuda propaga. O que iremos analisar juntos, hoje, é a conversa em si, a final de contas o que é conversar?

 A palavra conversar vem do latim conversare, que originalmente significa conviver com alguém. Conversare, por sua vez, vem da raiz verso, com significado de voltar ou direcionar para algum lado, mais o prefixo com, significa junto ou na companhia de alguém. Sendo assim conversar significa voltar-se para algo junto a alguém, ou seja, ambos voltarem sua atenção para algo.

 Infelizmente a linguagem que por tanto tempo evoluiu, se tornou mais ampla e completa, tem sido acometida de uma corrosão onde as palavras têm perdido seus valores, pelo simples fato de serem usadas fora do contexto. Conversar é uma delas, pois ao menos aqui no estado do Paraná, Br, até o presente momento em 14 de setembro de 2020, conversar aparentemente é apenas despejar palavras de maneira consecutiva consigo; pois sim é possível e recomendável conversar consigo; com outro ou outros, mas sem realmente voltar-se para algo, é como andar às cegas em meio a um cerrado matagal. No entanto não deveria ser assim.

 A conversa deveria ser como que duas pessoas que, localizadas em uma mata virgem, cercados por centenas de quilômetros de floresta fechada, observam uma grande montanha e decidem abrir caminho para chegar ao seu destino, ora um abrindo caminho, ora o outro. Imagine que cada um possui um facão para abrir esse caminho, estas ferramentas são nossos argumentos, e, quanto mais afiadas estas estiverem, mais fácil será eliminar o “mato da ignorância” que cresce no solo da nossa mente, e não vamos nem entrar na questão dos insetos que se regozijam com tudo que é putrefato, e dos animais que podemos encontrar no caminho. Além do que, se apenas um argumentar, ele será o único a abrir o caminho, e, quanto mais fechada for a mata, tanto mais cansativo será a tarefa e demorada será a viagem, por isso é importante que todos os participantes saibam manejar sua ferramenta, e revezar no trabalho de avançar rumo ao “cume da compreensão”.

 Uma conversa, na grande maioria dos casos, são pessoas utilizando ferramentas erradas desordenadamente, cada um para uma direção, apenas deferindo golpes, lançando palavras ao vento, apenas quebrando o silencio, mas sem avançar rumo a alguma direção planejada. Gostaria que você, meu amigo, pare e tente lembrar do que você conversou com seu cônjuge, pai, mãe, namorado/namorada ou amigos ontem, antes de ontem, semana passada. Vocês progrediram rumo a algum lugar, a algum objetivo, a alguma ideia, ou apenas quebraram o silencio?

Uma das mais famosas frases de Nietzche diz “não venha roubar a minha solidão, se não tiver algo mais valioso para oferecer em troca”, mas a questão é que as pessoas não querem mais estar na solidão, pois tem medo de estarem a sós com seus medos, desejos e sonhos, e pilham suas vidas com quinquilharias, redes sociais, “musicas” barulhentas, filmes, séries, leituras rasas, e acabam carregando tanta tralha mental, que prosseguir rumo ao pico de uma montanha abrindo caminho em um matagal, carregando sua bagagem é algo exaustivo, e por isso preferem permanecer com suas banalidades, perdidos, longe da evolução e da contemplação do todo, que se alcança ao atingir o pico do monte.

 Essa falta de conhecimento de si e do grupo em que se está inserido, essa falta de definir metas elevadas da compreensão do ser e da sociedade, é a causa principal da falta de conversas no nosso cotidiano, e isso se da pelo preconceito que se tem com relação à filosofia, psicologia e teologia, que na verdade tratam do mesmo tema sob perspectivas diferentes, com abordagens diferentes, mas que ainda são vistas como temas complexos demais, “coisa de gente doida”, de quem não tem o que fazer, porém negligenciar estes temas é mergulhar no vazio existencial, ou se manter na zona rasa da vida.

 La do pico do monte a visão é ampla, o ar é puro, os sentidos são aguçados. Do cume do monte temos real compreensão do nosso lugar no mundo, do nosso tamanho, do caminho que devemos seguir adiante. Por isso eu te convido, vamos afiar nossos argumentos, vamos jogar fora o que é supérfluo e vamos abrir caminho, juntos, rumo à compreensão, rumo ao monte da sabedoria, que é maior, mais alto e mais solido do que a mata da ignorância. Vamos conversar.


Comentários